Em boletim da AEPPA
29 novembro 2010
27 novembro 2010
Intervenções Militares Americanas
INTERVENÇÕES AMERICANAS NO MUNDO
Organizado por Alberto da Silva Jones (professor da UFSC)
Entre as várias INTERVENÇÕES das forças armadas dos Estados Unidos fizeram nos séculos XIX, XX e XXI, podemos citar:
1846 - 1848 - MÉXICO - Por causa da anexação, pelos EUA, da República do Texas
1890 - ARGENTINA - Tropas americanas desembarcam em Buenos Aires para defender interesses económicos americanos.
1891 - CHILE - Fuzileiros Navais esmagam forças rebeldes nacionalistas.
1891 - HAITI - Tropas americanas debelam a revolta de operários negros na ilha de Navassa, reclamada pelos EUA.
1893 - HAWAI - Marinha enviada para suprimir o reinado independente anexar o Hawaí aos EUA.
1894 - NICARÁGUA - Tropas ocupam Bluefields, cidade do mar do Caribe, durante um mês.
1894 - 1895 - CHINA - Marinha, Exército e Fuzileiros desembarcam no país durante a guerra sino-japonesa.
1894 - 1896 - CORÉIA - Tropas permanecem em Seul durante a guerra.
1895 - PANAMÁ - Tropas desembarcam no porto de Corinto, província Colombiana.
1898 - 1900 - CHINA - Tropas dos Estados Unidos ocupam a China durante a Rebelião Boxer.
1898 - 1910 - FILIPINAS - As Filipinas lutam pela independência do país, dominado pelos EUA (Massacres realizados por tropas americanas em Balangica, Samar, Filipinas - 27/09/1901 e Bud Bagsak, Sulu, Filipinas 11/15/1913) - 600.000 Filipinos mortos.
1898 - 1902 - CUBA - Tropas sitiaram Cuba durante a guerra hispano-americana.
1898 - Presente - PORTO RICO - Tropas sitiaram Porto Rico na guerra hispano-americana, hoje 'Estado Livre Associado' dos Estados Unidos.
1898 - ILHA DE GUAM - Marinha americana desembarca na ilha e a mantêm como base naval até hoje.
1898 - ESPANHA - Guerra Hispano-Americana - Desencadeada pela misteriosa explosão do encouraçado Maine, em 15 de fevereiro, na Baía de Havana. Esta guerra marca o surgimento dos EUA como potência capitalista e militar mundial.
1898 - NICARÁGUA - Fuzileiros Navais invadem o porto de San Juan del Sur.
1899 - ILHA DE SAMOA - Tropas desembarcam e invadem a Ilha em consequência de conflito pela sucessão do trono de Samoa.
1899 - NICARÁGUA - Tropas desembarcam no porto de Bluefields e invadem a Nicarágua (2ª vez).
1901 - 1914 - PANAMÁ - Marinha apoia a revolução quando o Panamá reclamou independência da Colômbia; tropas americanas ocupam o canal em 1901, quando teve início sua construção.
1903 - HONDURAS - Fuzileiros Navais americanos desembarcam em Honduras e intervêm na revolução do povo hondurenho.
1903 - 1904 - REPÚBLICA DOMINICANA - Tropas norte americanas atacaram e invadiram o território dominicano para proteger interesses do capital americano durante a revolução.
1904 - 1905 - CORÉIA - Fuzileiros Navais dos Estados Unidos desembarcaram no território coreano durante a guerra russo-japonesa.
1906 - 1909 - CUBA - Tropas dos Estados Unidos invadem Cuba e lutam contra o povo cubano durante período de eleições.
1907 - NICARÁGUA - Tropas americanas invadem e impõem a criação de um protectorado, sobre o território livre da Nicarágua.
1907 - HONDURAS - Fuzileiros Navais americanos desembarcam e ocupam Honduras durante a guerra de Honduras com a Nicarágua.
1908 - PANAMÁ - Fuzileiros Navais dos Estados Unidos invadem o Panamá durante período de eleições.
1910 - NICARÁGUA - Fuzileiros navais norte americanos desembarcam e invadem pela 3ª vez Bluefields e Corinto, na Nicarágua.
1911 - HONDURAS - Tropas americanas enviadas para proteger interesses americanos durante a guerra civil, invadem Honduras.
1911 - 1941 - CHINA - Forças do exército e marinha dos Estados Unidos invadem mais uma vez a China durante período de lutas internas repetidas.
1912 - CUBA - Tropas americanas invadem Cuba com a desculpa de proteger interesses americanos em Havana.
1912 - PANAMÁ - Fuzileiros navais americanos invadem novamente o Panamá e ocupam o país durante eleições presidenciais.
1912 - HONDURAS - Tropas norte americanas mais uma vez invadem Honduras para proteger interesses do capital americano.
1912 - 1933 - NICARÁGUA - Tropas dos Estados Unidos com a desculpa de combaterem guerrilheiros invadem e ocupam o país durante 20 anos.
1913 - MÉXICO - Fuzileiros da Marinha americana invadem o México com a desculpa de evacuar cidadãos americanos durante a revolução.
1913 - MÉXICO - Durante a Revolução mexicana, os Estados Unidos bloqueiam as fronteiras mexicanas em apoio aos revolucionários.
1914 - 1918 - PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL - Os EUA entram no conflito em 6 de abril de 1917 declarando guerra à Alemanha. As perdas americanas chegaram a 114 mil homens.
1914 - REPÚBLICA DOMINICANA - Fuzileiros navais da Marinha dos Estados invadem o solo dominicano e interferem na revolução do povo dominicano em Santo Domingo.
1914 - 1918 - MÉXICO - Marinha e exército dos Estados Unidos invadem o território mexicano e interferem na luta contra nacionalistas.
1915 - 1934 - HAITI- Tropas americanas desembarcam no Haiti, em 28 de julho, e transformam o país numa colónia americana, permanecendo lá durante 19 anos.
1916 - 1924 - REPÚBLICA DOMINICANA - Os EUA invadem e estabelecem um governo militar na República Dominicana, em 29 de novembro, ocupando o país durante oito anos.
1917 - 1933 - CUBA - Tropas americanas desembarcam em Cuba, e transformam o país num protectorado económico americano, permanecendo essa ocupação por 16 anos.
1918 - 1922 - RÚSSIA - Marinha e tropas americanas enviadas para combater a revolução Bolchevista. O Exército realizou cinco desembarques, sendo derrotado pelos russos em todos eles.
1919 - HONDURAS - Fuzileiros norte americanos desembarcam e invadem mais uma vez o país durante eleições, colocando no poder um governo a seu serviço.
1918 - IUGOSLÁVIA - Tropas dos Estados Unidos invadem a Iugoslávia e intervêm ao lado da Itália contra os sérvios na Dalmácia.
1920 - GUATEMALA - Tropas americanas invadem e ocupam o país durante greve operária do povo da Guatemala.
1922 - TURQUIA - Tropas norte americanas invadem e combatem nacionalistas turcos em Smirna.
1922 - 1927 - CHINA - Marinha e Exército americano mais uma vez invadem a China durante revolta nacionalista.
1924 - 1925 - HONDURAS - Tropas dos Estados Unidos desembarcam e invadem Honduras duas vezes durante eleição nacional.
1925 - PANAMÁ - Tropas americanas invadem o Panamá para debelar greve geral dos trabalhadores panamenhos.
1927 - 1934 - CHINA - Mil fuzileiros americanos desembarcam na China durante a guerra civil local e permanecem durante sete anos, ocupando o território chinês.
1932 - EL SALVADOR - Navios de Guerra dos Estados Unidos são deslocados durante a revolução das Forças do Movimento de Libertação Nacional - FMLN -
comandadas por Marti.
1939 - 1945 - SEGUNDA GUERRA MUNDIAL - Os EUA declaram guerra ao Japão em 8 de dezembro de 1941 e depois a Alemanha e Itália, invadindo o Norte da África, a Ásia e a Europa, culminando com o lançamento das bombas atómicas sobre as cidades desmilitarizadas de Iroshima e Nagasaki.
1946 - IRÃO - Marinha americana ameaça usar artefactos nucleares contra tropas soviéticas caso as mesmas não abandonem a fronteira norte do Irã.
1946 - IUGOSLÁVIA - Presença da marinha americana ameaçando invadir a zona costeira da Iugoslávia em resposta a um avião espião dos Estados Unidos abatido pelos soviéticos.
1947 - 1949 - GRÉCIA - Operação de invasão de Comandos dos EUA garantem vitória da extrema direita nas "eleições" do povo grego.
1947 - VENEZUELA - Em um acordo feito com militares locais, os EUA invadem e derrubam o presidente eleito Rómulo Gallegos, como castigo por ter aumentado o preço do petróleo exportado, colocando um ditador no poder.
1948 - 1949 - CHINA - Fuzileiros americanos invadem pela ultima vez o território chinês para evacuar cidadãos americanos antes da vitória comunista.
1950 - PORTO RICO - Comandos militares dos Estados Unidos ajudam a esmagar a revolução pela independência de Porto Rico, em Ponce.
1951 - 1953 - CORÉIA - Início do conflito entre a República Democrática da Coreia (Norte) e República da Coréia (Sul), na qual cerca de 3 milhões de pessoas morreram. Os Estados Unidos são um dos principais
protagonistas da invasão usando como pano de fundo a recém criada Nações Unidas, ao lado dos sul-coreanos. A guerra termina em julho de 1953 sem vencedores e com dois estados polarizados: comunistas ao norte e um governo pró-americano no sul. Os EUA perderam 33 mil homens e mantém até hoje base militar e aero-naval na Coreia do Sul.
1954 - GUATEMALA - Comandos americanos, sob controle da CIA, derrubam o presidente Arbenz, democraticamente eleito, e impõem uma ditadura militar no país. Jacobo Arbenz havia nacionalizado a empresa United Fruit e impulsionado a Reforma Agrária.
1956 - EGITO - O presidente Nasser nacionaliza o canal de Suez. Tropas americanas se envolvem durante os combates no Canal de Suez sustentados pela Sexta Frota dos EUA. As forças egípcias obrigam a coalizão franco-israelense- britânica, a retirar-se do canal.
1958 - LÍBANO - Forças da Marinha americana invadem apoiam o exército de ocupação do Líbano durante sua guerra civil.
1958 - PANAMÁ - Tropas dos Estados Unidos invadem e combatem manifestantes nacionalistas panamenhos.
1961 - 1975 - VIETNÃ. Aliados ao sul-vietnamitas, o governo americano invade o Vietnã e tenta impedir, sem sucesso, a formação de um estado comunista, unindo o sul e o norte do país. Inicialmente a participação americana se restringe a ajuda económica e militar (conselheiros e material bélico). Em agosto de 1964, o congresso americano autoriza o presidente a lançar os EUA em guerra. Os Estados Unidos deixam de ser simples consultores do exército do Vietname do Sul e entram num conflito traumático,
que afectaria toda a política militar dali para frente. A morte de quase 60 mil jovens americanos e a humilhação imposta pela derrota do Sul em 1975, dois anos depois da retirada dos Estados Unidos, moldou a estratégia futura de evitar guerras que impusessem um custo muito alto de vidas americanas e nas quais houvesse inimigos difíceis de derrotar de forma convencional, como os vietcongues e suas tácticas de guerrilhas.
1962 - LAOS - Militares americanos invadem e ocupam o Laos durante guerra civil contra guerrilhas do Pathet Lao.
1964 - PANAMÁ - Militares americanos invadiram mais uma vez o Panamá e mataram 20 estudantes, ao reprimirem a manifestação em que os jovens queriam trocar, na zona do canal, a bandeira americana pela bandeira e seu país.
1965 - 1966 - REPÚBLICA DOMINICANA - Trinta mil fuzileiros e pára-quedistas norte americanos desembarcaram na capital do país São Domingo para impedir a nacionalistas panamenhos de chegarem ao poder. A CIA conduz Joaquín Balaguer à presidência, consumando um golpe de estado que depôs o presidente eleito Juan Bosch. O país já fora ocupado pelos americanos de 1916 a 1924.
1966 - 1967 - GUATEMALA - Boinas Verdes e marines americanos invadem o país para combater movimento revolucionário contrario aos interesses económicos do capital americano.
1969 - 1975 - CAMBOJA - Militares americanos enviados depois que a Guerra do Vietname invadem e ocupam o Camboja.
1971 - 1975 - LAOS - EUA dirigem a invasão sul-vietnamita bombardeando o território do vizinho Laos, justificando que o país apoiava o povo vietnamita em sua luta contra a invasão americana.
1975 - CAMBOJA - 28 marines americanos são mortos na tentativa de resgatar a tripulação do petroleiro estadunidense Mayaquez.
1980 - IRÃ - Na inauguração do estado islâmico formado pelo Aiatolá Khomeini, estudantes que haviam participado da Revolução Islâmica do Irão ocuparam a embaixada americana em Teerão e fizeram 60 reféns. O governo americano preparou uma operação militar surpresa para executar o resgate, frustrada por tempestades de areia e falhas em equipamentos. Em meio à frustrada operação, oito militares americanos morreram no choque entre um helicóptero e um avião. Os reféns só seriam libertados um ano depois do seqüestro, o que enfraqueceu o então presidente Jimmy Carter e elegeu Ronald Reagan, que conseguiu aprovar o maior orçamento militar em época de paz até então.*
1982 - 1984 - LÍBANO - Os Estados Unidos invadiram o Líbano e se envolveram nos conflitos do Líbano logo após a invasão do país por Israel - e acabaram envolvidos na guerra civil que dividiu o país. Em 1980, os americanos supervisionaram a retirada da Organização pela Libertação da Palestina de Beirute. Na segunda intervenção, 1.800 soldados integraram uma força conjunta de vários países, que deveriam restaurar a ordem após o massacre de refugiados palestinos por libaneses aliados a Israel. O custo para os americanos foi a morte 241 fuzileiros navais, quando os libaneses explodiram um carro bomba perto de um quartel das forças americanas.
1983 - 1984 - ILHA DE GRANADA - Após um bloqueio económico de quatro anos a CIA coordena esforços que resultam no assassinato do 1º Ministro Maurice Bishop. Seguindo a política de intervenção externa de Ronald Reagan, os Estados Unidos invadiram a ilha caribenha de Granada alegando prestar protecção a 600 estudantes americanos que estavam no país, as tropas eliminaram a influência de Cuba e da União Soviética sobre a política da ilha.
1983 - 1989 - HONDURAS - Tropas americanas enviadas para construir bases em regiões próximas à fronteira, invadem o Honduras
1986 - BOLÍVIA - Exército americano invade o território boliviano na justificativa de auxiliar tropas bolivianas em incursões nas áreas de cocaína.
1989 - ILHAS VIRGENS - Tropas americanas desembarcam e invadem as ilhas durante revolta do povo do país contra o governo pró-americano.
1989 - PANAMÁ - Baptizada de Operação Causa Justa, a intervenção americana no Panamá foi provavelmente a maior batida policial de todos os tempos: 27 mil soldados ocuparam a ilha para prender o presidente panamenho, Manuel Noriega, antigo ditador aliado do governo americano. Os Estados Unidos justificaram a operação como sendo fundamental para proteger o Canal do Panamá, defender 35 mil americanos que viviam no país, promover a democracia e interromper o tráfico de drogas, que teria em Noriega seu líder na América Central. O ex-presidente cumpre prisão perpétua nos Estados Unidos.
1990 - LIBÉRIA - Tropas americanas invadem a Libéria justificando a evacuação de estrangeiros durante guerra civil.
1990 - 1991 - IRAQUE - Após a invasão do Iraque ao Kuwait, em 2 de agosto de 1990, os Estados Unidos com o apoio de seus aliados da OTAN, decidem impor um embargo económico ao país, seguido de uma coalizão anti-Iraque (reunindo além dos países europeus membros da OTAN, o Egipto e outros países árabes) que ganhou o título de "Operação Tempestade no Deserto". As hostilidades começaram em 16 de janeiro de 1991, um dia depois do fim do prazo dado ao Iraque para retirar tropas do Kuwait. Para expulsar as forças iraquianas do Kuwait, o então presidente George Bush destacou mais de 500 mil soldados americanos para a Guerra do Golfo.
1990 - 1991 - ARÁBIA** SAUDITA - Tropas americanas destacadas para ocupar a Arábia Saudita que era base militar na guerra contra Iraque.
1992 - 1994 - SOMÁLIA - Tropas americanas, num total de 25 mil soldados, invadem a Somália como parte de uma missão da ONU para distribuir mantimentos para a população esfomeada. Em dezembro, forças militares norte-americanas (comando Delta e Rangers) chegam a Somália para intervir numa guerra entre as facções do então presidente Ali Mahdi Muhammad e tropas do general rebelde Farah Aidib. Sofrem uma fragorosa derrota militar nas ruas da capital do país.
1993 - IRAQUE -No início do governo Clinton, é lançado um ataque contra instalações militares iraquianas, em retaliação a um suposto atentado, não concretizado, contra o ex-presidente Bush, em visita ao Kuwait.
1994 - 1999 - HAITI - Enviadas pelo presidente Bill Clinton, tropas americanas ocuparam o Haiti na justificativa de devolver o poder ao presidente eleito Jean-Betrand Aristide, derrubado por um golpe, mas o
que a operação visava era evitar que o conflito interno provocasse uma onda de refugiados haitianos nos Estados Unidos.
1996 - 1997 - ZAIRE (EX REPÚBLICA DO CONGO) - Fuzileiros Navais americanos são enviados para invadir a área dos campos de refugiados Hutus onde a revolução congolesa ? Marines evacuam civis? iniciou.
1997 - LIBÉRIA - Tropas dos Estados Unidos invadem a Libéria justificando a necessidade de evacuar estrangeiros durante guerra civil sob fogo dos rebeldes.
1997 - ALBÂNIA - Tropas americanas invadem a Albânia para evacuarem estrangeiros.
2000 - COLÔMBIA - Marines e "assessores especiais" dos EUA iniciam o Plano Colômbia, que inclui o bombardeamento da floresta com um fungo transgênico fusarium axyporum (o "gás verde").
2001 - AFEGANISTÃO - Os EUA bombardeiam várias cidades afegãs, em resposta ao ataque terrorista ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001. Invadem depois o Afeganistão onde estão até hoje.
2003 - IRAQUE - Sob a alegação de Saddam Hussein esconder armas de destruição e financiar terroristas, os EUA iniciam intensos ataques ao Iraque. É baptizada pelos EUA de "Operação Liberdade do Iraque" e por Saddam de "A Última Batalha", a guerra começa com o apoio apenas da Grã-Bretanha, sem o endosso da ONU e sob protestos de manifestantes e de governos no mundo inteiro. As forças invasoras americanas até hoje estão no território iraquiano, onde a violência aumentou mais do que nunca.
26 novembro 2010
Carlos Marighella, Nov 69
"De acordo com a linha internacionalista de Guevara e o princípio de que " o dever do revolucionário é fazer a revolução ", o nome de Marighella inscreve-se na luta dos povos do Terceiro Mundo. Quando renunciou ao cargo que ocupava na direcção do Partido Comunista Brasileiro, dizia que o fazia porque estava disposto a lutar revolucionáriamente junto das massas e não ficar à espera do jogo politíco-burocrático e convencional dos dirigentes.
A sua prespectiva... "Não há outra saída para o terceiro mundo, excepto a organização da guerra justa e necessária contra o imperialismo".
Marighella apontava o exemplo do Vietname e de Cuba aos revolucionários brasileiros e proclamava a luta aberta ao capitalismo nacional e estrangeiro, ao capital sem pátria, e não apenas ao capitalismo monopolista brasileiro"
Dez/74 Adérito Lopes, em introdução ao "Manual do guerrilheiro urbano"
Carlos Mariguella é morto a 4 Novembro de 1969 |
CARTA AOS REVOLUCIONÁRIOS EUROPEUS
“ Queridos companheiros;
Faz algum tempo que os camaradas revolucionários brasileiros mantêm contacto convosco na Europa, por meio dos quais já estão a par das dificuldades que nós encontramos para fazer avançar a revolução no Brasil.
Os companheiros que se encontram na Europa e que discutem convosco os problemas da nossa revolução, são companheiros autorizados e representam junto a vós a nossa organização: ‘Acção Nacional Libertadora’.
A luta que levamos a cabo no Brasil é uma luta de libertação nacional, uma luta contra a classe dominante brasileira. É uma luta contra a actual ditadura militar fascista e, neste sentido, é uma luta antifascista. É uma luta anti-capitalista porque está dirigida contra os grandes capitalistas nacionais associados ao capital estrangeiro. É uma luta pelo socialismo porque tem como objectivo liquidar as classes que mantêm a actual estrutura económica e liquidar o domínio dos grandes capitalistas e latifundiários. Elas representam o maior obstáculo para a marcha em direcção ao socialismo, e são a base interna do imperialismo norte-americano e do capitalismo estrangeiro no nosso país.
A estratégia da ‘Acção Nacional Libertadora’ é a seguinte:
1 – O nosso inimigo é o imperialismo norte-americano. A nossa luta é anti-oligárquica e de libertação nacional. Dada a natureza dessa luta, o nosso objectivo é a transformação radical da estrutura de classes da sociedade brasileira.
2 – Lutamos pela conquista do poder e da destruição do aparato burocrático militar do estado brasileiro, e a sua substituição pelo povo armado. O nosso principal objectivo a instauração de um poder popular e revolucionário.
3 – O nosso programa é a expulsão dos norte-americanos do nosso país, a expropriação das empresas de capital privado nacional que colaboraram com o capital estrangeiro, a expropriação da propriedade latifundiária que hoje está na sua maior parte nas mão dos norte-americanos, e a realização da revolução agrária até às últimas consequências, com a libertação dos camponeses.
E também libertar o Brasil da condição de satélite da política externa dos Estados Unidos para alcançar uma condição de independência frente à política dos blocos militares mantendo uma política externa de apoio activo aos povos subdesenvolvidos em luta contra o colonialismo.
4 – O nosso meio de luta é a guerra revolucionária que já iniciamos no nosso país sob formação forma de guerrilha urbana. Com a expropriação dos bens dos grandes capitalistas nacionais, latifundiários e dos imperialistas yanques, com a sabotagem e a execução de espiões da CIA, como o capitão Chandler, instrutor anti-guerrilha no Vietname e no Brasil, com a apropriação de armas e explosivos, com as perdas e danos infligidos às instalações militares e ao potencial de fogo dos gorilas brasileiros.
5 – A nossa etapa presente consiste em passar da zona urbana à luta armada na zona rural contra os latifundiários, passando à guerrilha rural de movimentos, partindo da aliança armada de operários, camponeses e estudantes, até chegar à formação do exército revolucionário de libertação nacional.
A nossa luta é uma batalha de vida ou de morte contra a ditadura militar fascista brasileira.
Muitos companheiros estão encarcerados nas prisões da reacção e muitos deles foram atrozmente assassinados pela policia e exército brasileiro. Nós teremos urgente necessidade de que esses crimes sejam denunciados pelos jornais e outros meios, aos povos europeus.
Temos necessidade de que os documentos sejam difundidos no exterior para que se conheça a luta que estamos desenvolvendo no Brasil. Necessitamos armas e munições, recursos de qualquer espécie com que os revolucionários possam contribuir como participantes desta luta, que todos os revolucionários sustêm no mundo.
Não vemos distinção entre a luta que conduzimos no Brasil contra o imperialismo norte-americano e a ditadura militar fascista, e a luta que vós conduzis na Europa contra a reacção fascista, os trusts e monopólios, contra a guerra do Vietname, pelo socialismo, pela libertação e o progresso. A luta dos revolucionários europeus é a mesma dos revolucionários da América Latina.
Com esta apresentação, esperamos que os representantes da Acção Nacional Libertadora possam chegar a resultados favoráveis, indispensáveis para a intensificação da luta revolucionária no Brasil e em todo o continente americano.
Saudações revolucionárias
Carlos Marighella
Setembro 1969
25 novembro 2010
Ainda as falácias sobre o 25 Nov. 1975
"E se o “Diário de Notícias” fosse um jornal sério?"
É mais que conhecido as mentiras, deturpações, intencionais ou não, que teem sido escritas e ditas sobre o 25 Novembro de 1975.
Alguns escritos, são mesmo "primorosos", como o caso do Diário de Noticias de hoje.
Então vejamos como o João Alferes Gonçalves (jornalista) desmonta a historinha do DN.:
24 novembro 2010
23 novembro 2010
Libertação da Guiné, Revolução em Portugal (IV - IV)
IV. CONCLUSÃO: UMA DESCOLONIZAÇÃO EXEMPLAR
Em 10 de Setembro, quando do reconhecimento oficial da independência da Guiné-Bissau por parte de Portugal, Spínola aproveitou para lançar um aviso:
A maioria silenciosa do povo português terá pois de despertar e de se defender activamente dos totalitarismos extremistas que se digladiam na sombra [..] A consentir-se um clima anárquico de reivindicação incontrolada [.. ] O País mergulhará no caos económico e social, que só a sectores minoritários poderá aproveitar [...] É chegado o momento de o País acordar...] (90)
A situação era desesperante: Spínola via traição e subterfúgios por todo o lado, o MFA "enfeudado" ao Partido Comunista, a desintegração das forças armadas no ultramar, que se passavam para o lado dos seus opositores guerrilheiros, a anarquia e o caos na vida civil e na economia. Tornava-se necessária uma acção drástica se não se quisesse entregar Angola - o "Brasil africano" e elemento-chave no projecto de Spínola para uma comunidade lusíada -, do mesmo modo que se entregara a Guiné e Moçambique, e se não se quisesse que Portugal ficasse sob o domínio de "forças totalitárias". Spínola apelou directamente para o povo português. Escudando-se com os slogans "disciplina", "ordem" e "Pátria", aliou-se a toda a espécie de gruposculos neofascistas e colonos reaccionários, na tentativa de inverter o curso revolucionário em África e na metrópole e de destruir o MFA. A conspiração reaccionária, apressadamente organizada, destinava-se, aparentemente, a tomar o poder de um modo mais ou menos simultâneo em Lisboa, Luanda e Lourenço Marques. De qualquer forma, a prematura revolta dos colonos em Moçambique (7-10 de Setembro) deitou por terra esta jogada: em Lourenço-Marques, a revolta racista foi dominada pela acção conjunta das forças portuguesas e da Frelimo; em Luanda, a Junta Governativa de Rosa Coutinho controlou a situação através de severas medidas; e, em Lisboa, a manifestação da "maioria silenciosa", organizada por Spínola, foi impedida pela força conjunta do COPCON e da mobilização popular, tendo o MFA impedido a sua tentativa para a declaração do estado de sítio temporário, com suspensão das liberdades democráticas. Em 30 de Setembro, Spínola demitiu-se da presidência. A solução neocolonial fora derrotada- O MFA movimentou-se rapidamente no sentido da sua própria institucionalização como "garante" da continuação da revolução democrática e de uma descolonização bem sucedida...
Na Guiné, as etapas finais da descolonização processaram-se rápida e eficientemente. Os acordos de Argel apontavam para o dia 31 de Outubro de 1974 como data limite para a retirada das tropas portuguesas e, de facto, todo o processo de evacuação das cerca de 130 unidades militares e postos avançados, bem como a enorme força estacionada em Bissau, se cumpriu dentro do prazo previsto e sem que se tenha perdido uma única vida que fosse pela acção armada - não se tendo registado qualquer espécie de choque nem com guerrilheiros nem com a população (9I). Fabião deixou Bissau no último avião
(90) Rodrigues et al., 1976, op. cit., p. 84.
(91) Basi! Davidson." The Peoples Cause: a history of guerriltas in África, Londres, 1981, p. 172.
militar; regressado a Lisboa, foi nomeado chefe do Estado-Maior do Exército, tendo iniciado esforços nesta sua nova situação, em colaboração com os seus camaradas vindos da Guiné, no sentido de transplantar para as forças armadas em Portugal as estruturas democráticas desenvolvidas naquele território (92). Durante o mês de Novembro, o MFA preparou-se para o seu novo papel de vanguarda dinamizadora e a 6 de Dezembro realizou-se na capital a primeira assembleia geral nacional do MFA.
A história da luta pela independência na Guiné é fascinante; o impacte deste pequeno pais nos assuntos mundiais talvez não encontre paralelo nos tempos modernos.
A primeira parte do continente africano descoberta pelos exploradores portugueses em meados do século XV tornou-se, volvidos cinco séculos, no cemitério do colonialismo português e no primeiro dos territórios portugueses de África a obter a independência. A descolonização na Guiné, se bem que tardia, processou-se de um modo exemplar, lançando as bases para o desenvolvimento de relações cordiais entre Portugal e a sua ex-colónia no período pós-independência. Em Fevereiro de 1979, o presidente Ramalho Eanes, que servira como capitão no exército colonial em Canchungo, deslocou-se à Guiné para conversações que visavam o aprofundamento da cooperação técnica e cultural entre os dois Estados. Foi, como notou Eanes, a primeira visita que "um chefe de Estado eleito livremente pelos portugueses realiza oficialmente ao primeiro Estado reconhecido como independente e soberano pela antiga potência colonizadora" (93). Durante a sua visita, Eanes deslocou-se a Bafatá, onde colocou uma coroa de flores no monumento erguido a Amílcar Cabral, fundador e inspirador da nacionalidade guineense.
Foi um acto comovente e altamente simbólico: uma homenagem ao inestimável contributo de um grande homem que, com a sua acção, ajudou o povo português a libertar-se da sua longa e escura noite de ditadura e isolamento.
(92) Embora com menor sucesso, mas minando as bases elististas do MFA até aí existentes na metrópole.
(93) O Jornal de 23 de Fevereiro de 1979. 7755
John Woollacott* Análise Social, vol. xix (77-78-79), 1983-3.º, 4.º 5.º, 1131-
A luta pela libertação nacional na Guiné-Bissau e a revolução em Portugal
22 novembro 2010
21 novembro 2010
Libertação da Guiné, Revolução em Portugal (III - IV)
III NEGOCIAÇÃO E CONFRATERNIZAÇÃO
Embora, na metrópole, a intervenção popular tivesse assegurado profundas e imediatas repercussões para o 25 de Abril, as transformações ocorridas em Lisboa não provocaram alterações súbitas na maior parte do disperso Império Português. Enquanto, em Lisboa, a Junta foi compelida a desmobilizar e a prender os agentes da odiada PIDE/DGS, nas colónias esta foi simplesmente reorganizada sob um nome diferente. Os governadores-gerais foram temporariamente substituídos pelos seus secretários-gerais e o aparelho de estado colonial continuou a funcionar praticamente como antes (53). As forças armadas continuaram a efectuar "operações defensivas". Em Bissau, contudo, a mudança foi imediata e abrupta. Em 26 de Abril, na sequência das notícias vindas de Lisboa, militares locais rebeldes efectuaram o seu próprio golpe: pegaram no governador-geral, Bettencourt Rodrigues, e em vários colaboradores seus e despacharam-nos imediatamente para a capital (54) (bem como outros elementos "que não se quiseram adaptar" à nova situação). A PIDE foi dissolvida e os presos políticos foram libertados. Em Bissau, o MFA colocou-se firmemente no comando...
A reacção inicial do PAIGC às notícias do golpe de 25 de Abril foi a de o saudar, mas, perante as primeiras declarações dimanadas da Junta, declarou que a luta armada prosseguiria. Num inequívoco comunicado emanado do Comité Executivo de Luta, datado de 6 de Maio (embora, segundo parece, apenas divulgado mais tarde, em Argel), o PAIGC insistia em duas conclusões para o início das negociações com o novo Governo da metrópole:
(52) "Era presidente da República Portuguesa, mas agia ainda como se fosse governador da Guiné-Bissau!" [Mário Soares, Portugal: Que Revolução?, Lisboa, 1976, p. 35.]
(53) Especialmente em Angola, onde Soares Carneiro, o secretário-geral do governo colonial, assumiu o controlo, sendo substituído em 11 de Junho por Silvino Silvério Marques, um homem de ideias ultra e que fora governador em Luanda entre 1962 e 1966. Diz-se que o 25 de Abril apenas chegou a sério a Angola em Agosto, com a retirada de Silvério Marques e a nomeação de Rosa Coutinho para chefe de uma Junta Governativa Militar.
(54) Boletim do MFA, n.° 21, de 17 de Junho de 1975. 1145
1. Reconhecimento da República da Guiné-Bissau e do direito à autodeterminação e à independência para o seu povo e para o povo de Cabo Verde;
2. Reconhecimento dos mesmos direitos aos povos dos outros territórios portugueses em África.
O mesmo comunicado exigia ainda a cessação de todas as operações militares e "actos de agressão contra o povo", bem como o reagrupamento de todas as "forças de ocupação" nos seus postos de comando, como condições prévias para aceitação de um cessar fogo e para o inicio de "conversações" com o lado português (55), O exército colonial mostrava-se, todavia, com pouca vontade de procurar confrontos com as forças de guerrilha e de facto, no decurso do mês de Maio, à medida que se avizinhava o fim da estação seca, a luta militar efectivamente cessou. A nova administração militar em Bissau, nitidamente empenhada num corte com o passado colonial, parecia ansiosa em alcançar um acordo com o PAIGC, Alguns oficiais rebeldes pareciam, na verdade, simpatizar abertamente com os objectivos do movimento de libertação.
Talvez por isso, e provavelmente também devido às informações acerca da composição e do equilíbrio de poder dentro do novo regime de Lisboa, ou por pressões feitas por Senghor e por outros líderes africanos, ou muito simplesmente como um empreendimento táctico, o PAIGC anunciou, em 13 de Maio, que se encontrava pronto para entrar em negociações com os representantes portugueses, "com ou sem cessar fogo", tendo em vista "a libertação total do nosso povo" (56). Mário Soares, imediatamente após ter sido empossado no cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros do Primeiro Governo Provisório, em 16 de Maio, voou directamente para Dacar para efectuar conversações com Aristides Pereira, secretário-geral do PAIGC, em resultado das quais se anunciou que negociações bilaterais teriam início em 25 de Maio, em Londres (57).
Da delegação portuguesa às conversações de Londres faziam parte Mário Soares e Jorge Campinos, ambos membros do Partido Socialista e bem conhecidos pela sua oposição às guerras coloniais e ao colonialismo, Almeida Santos, ministro da Coordenação Interterritorial, e Almeida Bruno, representante das forças armadas e confidente de Spínola. O encontro com a delegação do PAIGC foi cordial e amigável, um encontro simbólico entre aliados na luta contra a ditadura colonial. A identidade de pontos de vista, das duas partes, acrescida do conhecimento de que o cessar fogo se tornava uma realidade de facto no território da Guiné, fez aumentar a esperança de um rápido acordo. Mas as conversações foram interrompidas ao fim do primeiro dia. A delegação portuguesa, apesar da sua boa vontade, estava coarctada pelas declarações da Junta e pelo programa do Governo de Lisboa. Não tinha margem de manobra. O PAIGC, sentindo a força da sua posição, reiterou a fidelidade aos princípios expostos no seu comunicado de 6 de Maio.
Soares e Almeida Bruno regressaram a Lisboa para consultar o seu presidente.
Mas Spínola, tal como o PAIGC, sabia perfeitamente que as condições de um acordo na Guiné abririam um claro precedente para as restantes colónias, onde estavam em jogo interesses económicos vitais e o futuro de consideráveis comunidades de colonos, pelo
(55) Afonso Praça et al, 25 de Abril, Lisboa, 1974, pp. 61-62.
(56) Keesings Contemporary Archives, 1974, p. 26 747.
(57) O Jornal de 25 de Abril de 1980.
que recusou qualquer espécie de concessão. Soares regressou sozinho a Londres (58). As conversações reiniciaram-se em 30 de Maio e voltaram novamente a ser abruptamente interrompidas.
No seguimento de novos contactos entre Soares e Senghor, em Paris, as conversações foram retomadas em 13 de Junho em Argel, sem que contudo se tivesse alcançado um acordo: o PAIGC insistia no pedido de reconhecimento da sua independência" os Portugueses insistiam na necessidade de um referendo. O PAIGC mostrava-se inflexível; por que razão haveriam de aceitar uma "consulta popular" sobre o futuro da Guiné, organizada pelos seus inimigos de outrora, quando já tinham eleito uma Assembleia Nacional, declarado a sua independência e sido reconhecidos como Estado soberano por 82 países? (59) Spínola enganava-se a si próprio ao pensar que seria possível manter a iniciativa na Guiné, quando, na verdade, há muito que esta pertencia ao PAIGC, Numa declaração feita à imprensa, em Argel, Soares disse claramente não acreditar haver qualquer esperança de progredir nas conversações enquanto não houvesse uma mudança no regime de Lisboa (60).
Spínola recusava-se a ceder. Na verdade, avaliava mal as forças políticas em presença. Tal como subestimava a maturidade política e a determinação do PAIGC, sobrevalorizava as suas próprias capacidades e calculava mal a força da sua posição, tanto na Guiné como em Portugal Incapaz de dominar o tigre que o 25 de Abril soltara, incapaz de conter a rápida desagregação das forças armadas no campo de combate e impossibilitado de contar com a lealdade daqueles em que tinha depositado confiança, Spínola sentiu de repente que o chão lhe fugia debaixo dos pés...
Na sequência do 25 de Abril, Spínola nomeara o tenente-corone! Carlos Fabião para o duplo cargo de encarregado do Governo (61) e comandante-chefe das forças armadas em Bissau Membro chave do staff de Spínola durante os anos de "sorrisos e sangue", conhecedor do país como ninguém, contando com um total de 12 anos de serviço militar na Guiné desde 1955, Fabião constituiu uma escolha esperada. No seu discurso de posse em Bissau, em 7 de Maio, elogiou "a figura e a obra do general Spínola na Guiné", dizendo que "a sua figura se projectou com a maior intensidade em todo o firmamento português, na sua verdadeira dimensão, na sua intocável verticalidade"(62).
Spínola, naturalmente, sentiu que podia depositar "confiança total" em Fabião e as instruções que lhe deu, antes do seu embarque para Bissau, "foram claras e concisas: pôr termo aos desmandos que ali se estavam praticando à sombra do 25 de Abril; negociar com o PAIGC, mas continuar o esforço defensivo de guerra até à assinatura do acordo de cessar fogo; dar continuidade ao processo político de autodeterminação ali iniciado no meu governo, já claramente apontado para uma consulta popular em termos
(58) Almeida Bruno foi substituído pelo major ManueS Monge - um outro spinolista -, que chegou a Londres após uma visita relâmpago a Bissau, onde relatou os progressos das conversações e se inteirou da situação militar (Expresso, de 1 e Junho de 1974).
(59) Os delegados do PAIGC às conversações de Londres, chefiados por Pedro Pires, entraram no Reino Unido com passaportes da Guiné independente (Expresso de 1 de Junho de 1974). Diga-se, de passagem, que o PAÍGC não receava testar a sua popularidade num processo eleitoral ou num referendo: quando mais tarde o izeram em Cabo Verde, obtiveram 93% dos votos.
(60) Faz estranhamente lembrar a difícil situação em que Spínola se encontrou perante o Governo de Caetano e em 1972 .
(61) Fabião recusou o título de governador-geral.
(62) Citado em Neves, op. cit., p. 270. 1147
autenticamente democráticos; e preparar a minha visita à província com vista a assegurar o respeito total por decisões tomadas de acordo com a vontade das populações, habituadas, aliás, a manifestá-las nos 'congressos do povo'" (63).
Mas Spínola depositara mal a sua confiança e não seria a última vez que o faria (64). Os 20 000 cartazes com a sua fotografia enviados para Bissau e destinados à preparação da campanha para a "consulta popular" foram deixados por Fabião nos caixotes (65).
Spínola nunca chegou a fazer a visita que planeara... Denunciou, subsequentemente, a conduta de Fabião como uma "traição", mas parece, na verdade, que a "lealdade deste provara ser maior em relação à sua experiência na Guiné do que em relação ao general do monóculo" (66): as directrizes autoritárias de Spínola tornavam-se completamente ultrapassadas pela extraordinária rapidez e sentido do desenrolar dos acontecimentos naquele território.
À excepção de algumas zonas de fronteira, nas semanas que se seguiram ao golpe, e à medida que as notícias iam chegando às guarnições isoladas nas partes mais longínquas do território, os recontros entre as tropas portuguesas e o PAIGC começaram a abrandar. Ganhar uma equívoca condecoração por serem os últimos a morrer por uma causa sem esperança era coisa que pouco entusiasmava os Portugueses. Assim, em fins de Maio, princípios de Junho, e de uma forma aparentemente espontânea, assistiu-se ao início da troca de contactos entre o exército colonial e o da guerrilha. A iniciativa era normalmente tomada, embora nem sempre, pelos comandantes do PAIGC, que saíam do mato para conversações. Trocavam-se opiniões acerca da guerra e das negociações enquanto se bebiam uns copos e, à medida que a confiança e as amizades cresciam, os inimigos de ontem convidavam-se mutuamente para "jantares e convívios intermináveis" (67). Realizavam-se jogos de futebol entre equipas de ambos os lados. Retiraram-se as minas das estradas e concederam-se "salvos-condutos" que permitiam aos soldados portugueses sair dos seus aquartelamentos e visitar as aldeias vizinhas. Os camponeses entravam nos quartéis para comerciar. Em Cacine, os guerrilheiros projectaram para as tropas portuguesas um filme sobre os acontecimentos do 25 de Abril! (68) Os soldados tiravam fotografias de braço dado com os seus parceiros guerrilheiros. O processo de confraternização na Guiné foi de facto extraordinário e sem paralelo na história da descolonização ocidental em África (69). Foi um processo característico da capacidade portuguesa (nem sempre positiva!) para rapidamente esquecer ressentimentos ou desacordos e transformar o inimigo num amigo; foi também, incontestavelmente, um tributo a Amílcar Cabral, que tinha conduzido uma guerra sem ódio nem racismo, uma guerra contra a ditadura colonial, mas jamais contra o povo português - nem mesmo quando este se apresentava fardado...
(63) Spínola, op. cit., pp- 273-274. Spínola estava certo de que ganharia em qualquer plebiscito ou em qualquer outra forma de consulta organizada na Guiné (ver Rodrigues et al., op. cit., p. 243).
(64) Cometeu um erro semelhante ao mandar Otelo a Lusaka, quando das negociações com a FRELIMO, com o objectivo de "vigiar Soares".
(65) Soares, op. cit., p. 36.
(66) Kenneth Maxwell, "Portugal under Pressure", in New York Review of Books de 29 de Maio de 1975, p. 28.
(67) Soares, op. cit., p. 38.
(68) Boletim do MFA de 17 de Junho de 1975.
(69) Anote-se, contudo, que no Verão de 1974 se desenrolou um processo semelhante em Moçambique, 1148 embora numa escala provavelmente menos generalizada.
A confraternização neutralizou efectivamente as forças coloniais na Guiné. Entretanto, em Bissau, o MFA local trabalhou incansavelmente para promover a dinamização política das tropas, estender as suas raízes a todas as unidades militares no território, através de delegações eleitas democraticamente em cada quartel e compostas por oficiais do QP e do QC e ainda por sargentos e praças (70). A hierarquia tradicional, já seriamente comprometida pela conspiração contra o antigo regime e pelo golpe do 26 de Abril em Bissau (bem como pelo subsequente saneamento do comando militar), encontrava-se completamente marginalizada e destruída. O MFA criou, em substituição, as suas próprias estruturas de comando, no topo das quais se encontrava uma Comissão Coordenadora, um Secretariado e uma Assembleia Geral, representativa de todas as unidades e patentes. O programa do MFA foi divulgado na Guiné através da sua própria secção de informação naquele território (71). Com a cooperação de Fabião, o MFA apoderou-se firmemente do controlo das estruturas administrativas em Bissau Os grupos
"fantoches" FLING e MDG, "os traidores do povo", foram neutralizados.
A Emissora Regional abriu-se ao PAIGC, que assim conseguiu levar a cabo o seu trabalho político de uma forma aberta e sem entraves (72). Em certa altura, as forças de guerrilha chegaram mesmo a ser solicitadas na capital para pôr cobro à onda de criminalidade aí existente e em relação à qual o exército português se sentia incapaz de actuar por falta de "autoridade moral" (73).
O que aconteceu na Guiné foi um processo de simbiose entre o comando militar do MFA das forças coloniais portuguesas e o exército de guerrilha do PAIGC. A orientação e as acções radicais da vanguarda do MFA desencadearam uma profunda e compreensível reacção na massa dos militares que serviam na Guiné: tudo o que eles desejavam, no fim de contas, era regressar a casa; aliás, a mata da Guiné não era dos lugares mais agradáveis para se estar sem fazer nada, numa altura em que havia tanta incerteza e agitação em Portugal. O impasse das negociações de Londres e de Argel não foi claro, muito bem acolhido por eles. É neste contexto que podem ser compreendidas na íntegra as notáveis conclusões da Assembleia do MFA realizada em Bissau em 1 de Julho: cerca de mil delegados e outros participantes reuniram-se para aprovar uma moção que terminava com cinco pontos:
1. Repudiar qualquer solução local e unilateral que não seja aceite pelo Governo Central de Portugal;
2. Exigir que, vencendo os obstáculos levantados pelas forças reaccionárias e neocolonialistas, o Governo Português, de acordo com as soluções pertinente da ONU, reconheça imediatamente e sem equívocos a República da Guiné-Bissau e o direito à autodeterminação e independência dos povos de Cabo Verde, única política susceptível de conduzir à paz verdadeira;
3. Exigir que sejam imediatamente reatadas negociações com o PAIGC, não para negociar o direito à independência, mas tão-só os mecanismos conducentes a transferência de poderes;
(70) Em Portugal e nas restantes colónias, o MFA era ainda composto exclusivamente por oficiais de carreira.
(71) Para uma descrição detalhada da estrutura, organização e trabalho desenvolvido pelo MFA na Guiné veja-se o artigo publicado no Boletim do MFA, n.° 4, de 12 de Novembro de 1974.
(72) Compare-se, uma vez mais, com a situação existente em Angola, onde os movimentos de guerrilha ainda operavam, nesta mesma altura, num regime de semiclandestinidade.
(73) Entrevista em Setembro de 1980. 1149
4. Exigir que sejam desde já dadas por findas as comissões de todos os militares com 18 meses no mato e 21 meses em Bissau, processando-se a evacuação gradual dos restantes militares nos termos do acordo a celebrar com o PAIGC;
5. Apelar para que os militares portugueses encarem a sua presença actual e futura na Guiné como uma forma de prestar a sua cooperação desinteressada ao povo da Guiné, assim contribuindo para o pagamento da dívida histórica criada pelo colonialismo português (74).
O PAIGC, através dos seus contactos com o MFA e as autoridades em Bissau, tomou conhecimento imediato deste histórico documento. Na sequência do impasse das conversações ao nível oficial, em Argel, o movimento de libertação tinha prosseguido com aquilo a que chamava "conversas" no mato" com Fabião e representantes do MFA. Destas conversas encontrava-se arredado o problema do reconhecimento de jure da independência guineense, centrando-se as mesmas, exclusivamente, em questões práticas relativas à transferência do poder para o movimento de libertação: foi elaborado
um calendário para a retirada das forças coloniais e para a passagem da administração para o PAIGC, de forma que as zonas ainda não controladas por este não entrassem num caos após a salda dos Portugueses. A transferência das responsabilidades relativas à justiça e à ordem, transportes públicos, correios, fornecimentos de electricidade, distribuição de abastecimentos, etc, foi detalhada e meticulosamente planeada. Fabião limitou-se a criticar construtivamente as propostas que lhe eram apresentadas pelo PAIGC, tendo, deste modo, ambas as partes chegado a um acordo (oficioso) que iria, mais tarde, servir de base ao acordo oficial assinado em Argel; a retirada das forças portuguesas processou-se, pois, rapidamente e sem dificuldades.
O vertiginoso desenrolar dos acontecimentos na Guiné escapava completamente ao controlo de Spínola: de facto, este encontrava-se demasiado preocupado com os problemas mais imediatos em Lisboa, onde se tornava cada vez mais azeda a luta com a CCP do MFA, no tocante ao controlo das forças armadas, do Estado e, portanto, do próprio processo de descolonização.
Spínola tentava preservar a disciplina e a hierarquia militar tradicionais, fazer com que o Exército "regressasse aos quartéis", ao passo que o MFA lutava por conseguir um saneamento efectivo nos postos de comando, criar novas estruturas, assumir o papel de vanguarda dinamizadora dentro das forças armadas, de forma a alargar e a aprofundar a sua base de apoio.
Spínola esforçou-se por dissolver completamente o MFA e assumir o controlo incontestado do Estado; o MFA respondeu com firmeza a todos os seus ataques" bateu-se por lugares-chave e manteve o plano operacional de ura 25 de Abril "em rodas". Para Spínola, a revolução tinha terminado, para o MFA, mal começara.
Numa reunião realizada na Manutenção Militar, em 13 de Junho, Spínola pediu ao plenário do MFA um voto de confiança em si como condutor do processo de descolonização e intérprete dos objectivos constantes do programa do MFA, defendendo ao mesmo tempo que as forças armadas deveriam regressar aos quartéis75. A resposta do MFA foi equívoca, uma vez que se sentia demasiado fraco e vulnerável
(74) Reproduzida no Boletim do MFA de 17 de Junho de 1975. 1150 75 Rodrigues et ai, Portugal depois de Abril, Lisboa, 1976, pp. 34-35.
para se confrontar abertamente com Spínola (76). O pedido de Sá Carneiro para que fosse declarado o estado de sítio não obteve qualquer resposta. Estava-se num impasse. Mas a crise de autoridade e a eclosão de hostilidades abertas, que se sentia inevitavelmente iminente, podiam, quando muito, ser adiadas, mas não evitadas. Na opinião do primeiro-ministro, Palma Carlos (77), em Portugal "estava a caminhar-se para um clima de inteira irresponsabilidade e indisciplina"; havia confusão quanto à competência dos vários órgãos do Estado, faltava a autoridade ao Governo e o presidente não possuía um mandato claro que lhe permitisse assumir o controlo exclusivo do processo de descolonização:
Senhor Presidente, isto assim não pode continuar, é necessário que haja um presidente legitimamente eleito até para resolver o caso do ultramar.
Palma Carlos propôs por isso, que se organizassem imediatamente eleições para a presidência, através de sufrágio universal, que se promulgasse uma Constituição provisória, sujeita a ratificação por referendo, e, por último, que fossem alargados os poderes do primeiro-ministro, incluindo o de escolher os elementos do seu próprio governo. Em 8 de Julho, o Conselho de Estado, pressionado pela Comissão Coordenadora do MFA, rejeitou estas propostas (78), Em 9 de Julho, e não obstante os pedidos de Spínola, Palma Carlos demitiu-se.
Apesar da neutralidade que Spínola simulava, o certo ê que a consequência da crise representou uma importante derrota para si próprio" A sua escolha para substituir Palma Carlos como primeiro-ministro recaiu em Firmino Miguel, que declinou o lugar, pelo que se viu obrigado a aceitar o homem que o MFA lhe propunha: o coronel Vasco Gonçalves- O segundo Governo Provisório, empossado em 18 de Julho, incluía oito militares num conjunto de dezassete ministros (79) e revelou-se consideravelmente mais radicai que o antecedente. Esta vitória política do MFA viu-se ainda reforçada com a criação" em 12 de Julho, de urna força de segurança - o COPCON -~, nominalmente dependente de Costa Gomes, isto ê, do chefe do Estado-Maior, mas controlada, na realidade, pelo MFA - o braço militar" o "órgão operacional" da Comissão Coordenadora. O acentuado minar da posição de Spínola em Lisboa foi prontamente aproveitado pelo MFA. Imediatamente a seguir à crise desencadeada pela demissão de Palma Carlos eclodira em Luanda um sangrento motim racista e, a 22 de Julho, o governador-geral, Silvério Marques, um homem de escassos sentimentos democráticos, considerado um confidente de Spínola, recebeu ordens para regressar a Lisboa. Dois dias mais tarde, Soares de Melo, governador-geral em Lourenço Marques, demitiu-se. Foram nomeadas juntas governativas, compostas exclusivamente por militares, para assumirem a administração de Angola e Moçambique. Em 24 de Julho, o Conselho de
(76) Segundo Rodrigues et al., 1976, op. cit., p, 34, nem todos os oficiais do MFA compareceram ao plenário da Manutenção Militar, com receio de que Spínola estivesse a engendrar um plano para os afastar na primeira ocasião.
(77) Palma Carlos era um conservador de venho estilo, que partilhava, em relação à questão do ultramar, a mesma opinião que o seu presidente. As citações aqui reproduzidas foram extraídas de uma entrevista sua publicada no Expresso em 22 de Abril de 1977.
(78) O aumento dos poderes do primeiro-ministro foi, na verdade, aceite.
(79) Com Vasco Gonçalves como primeiro-ministro e Melo Antunes e Vítor Alves como ministros sem pasta, a CCP do MFA viu assegurada a sua posição de controlo. 1151
Julho, o Conselho de Estado aprovou a nova lei constitucional, que, reafirmando os princípios primeiros contidos no programa do MFA (80), consagrava o reconhecimento, por parte de Portugal, do direito dos povos colonizados à autodeterminação, "com todas as suas consequências (8I). Spínola não estava em posição de se furtar a esta decisão: não teve outra alternativa senão a de assinar a lei e, em 27 de Julho, proferiu na televisão e na rádio a sua famosa declaração:
[...] é chegado o momento de reiterar solenemente o nosso reconhecimento dos direitos dos habitantes dos territórios ultramarinos de Portugal à autodeterminação, incluindo o reconhecimento imediato do seu direito à independência (82).
O "fim das guerras coloniais" foi festejado com grandes manifestações realizadas em Lisboa, Coimbra e Porto. A viabilidade do projecto federalista preconizado por Spínola ficava moralmente enfraquecida (83).
Em 2 de Agosto deslocou-se a Lisboa o secretário-geral das Nações Unidas, Kurt Waldheim, para discutir com Spínola e com o Governo o processo de descolonização a ser adoptado nas colónias portuguesas. Deixou bem claro que, em relação à Guiné, Portugal não teria outra alternativa que não fosse a de entregar o poder ao PAIGC. Numa declaração feita em oito pontos nas Nações Unidas, em 4 de Agosto, Portugal anunciava estar pronto a reconhecer imediatamente a República da Guiné-Bissau como Estado independente e comprometia-se ainda a cooperar com as Nações Unidas para acelerar a descolonização nas ilhas de Cabo Verde (84).
Em 12 de Agosto, o Conselho de Segurança das Nações Unidas concordou unanimemente em recomendar à Assembleia Geral a aceitação da Guiné-Bissau como membro de pleno direito daquela organização. Os planos de Spínola relativos a uma "consulta popular" conducente à "autodeterminação" na Guiné estavam agora irremediavelmente ultrapassados: posto perante a completa desagregação da situação política e militar naquele território, sujeito a uma intensa pressão diplomática (85), embrenhado e distraído na luta pelo poder com o MFA, perante o rápido desenrolar do processo revolucionário em Portugal, apenas restava a Spínola aceitar o inevitável e tentar "salvar o possível no meio do impossível [...] o tempo de que dispúnhamos para negociar era curto e a situação interna era de fragilidade política e de anarquia militar, o que não permitia impor condições que sabíamos de antemão não virem a ser cumpridas"
(86). Em 26 de Agosto, Mário Soares e Pedro Pires assinaram em Argel o acordo que punha formalmente termo à administração portuguesa na Guiné e no qual se declarava que Portugal reconheceria de jure a existência daquela
(80) Redigido por Melo Antunes em Março e que contemplava o claro reconhecimento do direito dos povos colonizados à autodeterminação, emite uma atitude demasiado optimista em relação ao problema bem mais complexo da retirada em Angola, onde o movimento de libertação tinha uma implantação popular mais limitada, ao nível global do território, não possuindo uma estrutura com características permanentes de estado em desenvolvimento que preenchesse o vazio deixado pela descolonização.
(81) Lei n.° 7/74.
(82) Keesings Contemporary Archives, 1974, p. 26 747.
(83) Embora este mantivesse ainda esperanças de poder controlar o processo de descolonização em Angola e talvez em Moçambique
(84) Keesings, op. cit. Os restantes pontos da declaração referiam-se à descolonização dos outros territórios.
(85) Anote-se que muitos Estados africanos colocaram a questão do reconhecimento da Guiné como condição prévia para o estabelecimento ou para o reatamento de relações diplomáticas com Portugal. 1152 86 Spínola, op. cit.t p. 281.
República a partir de 10 de Setembro. O texto do acordo reafirmava e garantia ainda o direito das ilhas de Cabo Verde à autodeterminação e à independência (87). Dois dias mais tarde, o acordo de Argel foi ratificado, relutantemente, por Spínola, mas "consciente de que representava, no momento, a única solução possível" (88). O acordo de Argel representou uma vitória total para o PAIGC e mais um duro golpe no plano grandioso de Spínola relativo à formação de uma comunidade lusíada. As repercussões deste acordo fizeram-se imediatamente sentir na África meridional. Passados alguns dias sobre a ratificação do acordo de Argel, chegou-se a um acordo em Lusaka, após uns três meses de impasse nas negociações, para formação de um governo de transição em Lourenço Marques que conduziria Moçambique à independência, sob a chefia da Frelimo, em 25 de Julho de 1975. Sem uma experiência e conhecimento directos das condições existentes em Moçambique, Spínola viu-se, uma vez mais, sem grandes alternativas, e não teve outra saída senão a de ratificar o acordo, atendendo à deterioração do moral e da disciplina que se verificava nas forças armadas estacionadas naquele território. Como ele próprio previra, o resultado da luta na Guiné teria um tremendo impacte no processo global de descolonização:
O descalabro militar na Guiné modificou, assim, toda a possível estratégia política e criou um completo descontrolo nos sectores político-democráticos que desejavam uma descolonização negociada (89).
O PAIGC e os restantes movimentos de libertação eram, em sua opinião, "minorias de representatividade equívoca", catapultadas para o poder pela "traição" dos elementos "marxistas" do MFA e pela "prostituição" das forças armadas. Não é necessário compartilhar a opinião de Spínola sobre as capacidades políticas e militares dos movimentos de libertação, ou partilhar sequer a sua paranóica interpretação das motivações e actuações dos seus colegas militares para se compreender a realidade do enorme impacte do 25 de Abril no processo de aceleração conducente ao fim das longas lutas pela independência na Guiné, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e, mais tarde, em Angola também. A derrota do plano neocolonial de Spínola na Guiné, no seu "território natural", revestiu-se de um enorme significado: não só abriu um claro precedente para a natureza do tipo de descolonização a ser adaptado no resto do Império, como agudizou e forçou a rápida resolução das contradições do poder inerentes ao novo regime de Lisboa, fazendo avançar o processo revolucionário na metrópole e conduzindo, a breve trecho, à queda de Spínola e a uma mais profunda radicalização do Estado Português.
(87) A estratégia de Spínola fora a de afastar as ilhas do problema da Guiné durante as negociações para a independência. A informação disponível sobre a descolonização de Cabo Verde é limitada. Em 30 de Dezembro de 1974 foi formado um governo de transição que conduziu o arquipélago â independência total, sob a direcção do PAIGC, em.5 de Julho de 1975.
(88) Spínola, op. cit.,p. 285.
(89) Id., ibid., p. 282. 1153
John Woollacott* Análise Social, vol. xix (77-78-79), 1983-3.º, 4.º 5.º, 1131-
A luta pela libertação nacional na Guiné-Bissau e a revolução em Portugal
Continua
(Vêr tambem Post neste Blog: http://foradolugaretempo.blogspot.com/2010/10/reuniao-governo-da-guine-paigc-julho.html
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