29 outubro 2010

Gaza, um alerta em Portugal

Em vários locais de Lisboa
Foto livre de Carlos Filipe

Cooperativismo, pedra na engrenagem do sistema

Era grande o esforço e a coragem de jovens trabalhadores e estudantes, que nas colectividades, cooperativas, nos clubes de bairro, tentavam desenvolver uma actividade cultural de divulgação.
Remando contra as correntes 'Deus Pátria Autoridade', ou 'Fátima Fado Futebol' procuravam no minimo mostrar outros aspectos da vida em uma sociedade mais justa.


Cooperativa dos trabalhadores da Foz do Douro 1969/70

      

Dr. Prof. Armando de Castro



Armando de Castro (1918-1999)

      Licenciado em Ciências Jurídicas (1941) e em ciências Polítio-Económicas (1942) pela Universidade de Coimbra, foi posteriormente bolseiro do Instituto de Alta Cultura.
     Jubilou em 1988. Em 1965, à sua obra foi atribuído o Grande Prémio Nacional de Ensaio, pela Sociedade Portuguesa de Escritores.
      Economista, historiador e sociólogo, viu-se, por razões políticas, impedido de prosseguir a carreira académica, pelo que teve de exercer a advocacia até à queda do regime ditatorial salazarista. Nunca pensou em emigrar por entender que o seu lugar era no seu País. Os seus estudos sociais, históricos e económicos visavam fundamentalmente a compreensão da realidade portuguesa. Porém, durante muitos anos, nem sequer lhe era permitido o acesso às bibliotecas das Faculdades. Dedicou-se fundamentalmente à Economia Política, História Económica, História do Pensamento Económico, bem como à Epistemologia e Gnosiologia. Em Economia Política, trabalhou alguns dos temas mais árduos dos seus fundamentos teóricos, no tratamento sistemático da teoria do valor e da inflação. Ao estudar os fundamentos da Economia Política interroga-se sobre os rumos da investigação a fazer, avançando teses originais, desbravando matérias nunca antes estudadas, ensaiando novos modelos e metodologias de estudo. Os seus trabalhos são um exemplo de criatividade, de audácia e de rigor.
      A sua principal obra “A Evolução Económica de Portugal dos Séculos XII a XV”, além de relevante pelo pormenor com que nos dá a conhecer a economia medieval portuguesa, integra um completo “Tratado de Ciência Económica” onde se definem com rigor as principais categorias, se formulam leis económicas gerais e específicas, se desenvolve em profundidade a teoria do valor. São particularmente desenvolvidos capítulos sobre a renda, os meios de produção, as classes sociais, as relações económicas e sociais. Toda a exposição teórica é comprovada na prática com a descrição pormenorizada dos factos históricos.
                                                    Com a devida vénia, retirado da Net.

28 outubro 2010

Dos que tombaram


Alguém tem a certeza de que estão inscritos, os nomes de todos os que caíram em combate nas colónias portuguesas, ou em consequência de servirem sob a bandeira portuguêsa?
(fotos livres, de C. Filipe)

26 outubro 2010

À apreciação

Folheto deixado, nos trilhos ou afixado em arbustos, destinado às tropas portuguesas.


Folheto destribuido pelo Exército português (e outras autoridades) à população.

24 outubro 2010

Reunião: Governo da Guiné / PAIGC Julho 1974

Com a devida vénia e respeito pelo autor da obra onde está inserido este documento. (*)

Objectivo da divulgação: contribuir para o esclarecimento e anulação de deturpações dos factos históricos por falta de acesso à informação ou intencional deturpação dos acontecimentos.

RELATO DE REUNIÃO EFECTUADA ENTRE O ENCARREGADO DO GOVERNO DA GUINÉ (1) E UMA DELEGAÇÂO DO PAIGC

Dia 29 Julho 1974, das 1000 às 1200 H
Local da reunião - Cacine











(1) Encarregado do Governo da Guiné: Brigadeiro Fabião

(*) obra consultada: "O Meu Testemunho" de Aristides Pereira; da Notícias Editorial, Julho 2003





Angola


Publicado na imprensa internacional

Anti-colonialismo Estudantil e Militar

   O sector dos Estudantes universitários tomou frequentemente posição neste domínio. Logo no inicio da guerra de Angola, os “grupos universitários de acção patriótica” publicaram um documento “sobre o problema angolano”, que referia a incapacidade do Governo português para enveredar por uma solução pacifica, defendia o “reconhecimento do principio da negociação” e apelava no sentido de que “todos aqueles que estejam integrados nas forças armadas ou que venham a ser mobilizados se recusem a cumprir as determinações que, em sua consciência, violam os direitos humanos fundamentais”.
Além deste, e entre muitos outros, podem citar-se, como exemplo, dois comunicados:
- Um deles é um texto para discussão no projectado Encontro Nacional da Juventude em 1969; o seu 1º ponto era exactamente os “jovens e a guerra colonial”, e concluía com as seguintes exigências:
“Fim imediato da guerra colonial e regresso das tropas metropolitanas;
 Solução pacífica do conflito com a independência dos povos africanos, através de conversações com os Movimentos de Libertação;
Relações de paz e amizade com esses povos após a sua independência, numa base de igualdade de direitos”.
   - Um outro, vem datado de Fevereiro de 1970 e assinado pela União de Estudantes Comunistas (marxistas leninistas), e refere a convocação de uma manifestação de solidariedade com a luta dos povos oprimidos das colónias, convocação feita pelos Comités de Luta Anti-Colonial e manifestação a realizar a 21 de Fevereiro.
   O facto do meio universitário, globalmente considerado, desaprovar a política ultramarina do Governo, foi mesmo oficialmente admitido e reconhecido, conforme se pode ver por esta passagem do discurso de fim-de-ano às forças armadas, pronunciado pelo Ministro da Defesa em 30-12-1970:  A subversão procura atingir as Forças Armadas, através das fontes de recrutamento dos quadros que são os estabelecimentos de ensino. Ora em vários destes estabelecimentos não se consegue ensinar capazmente. São hoje verdadeiros centros de subversão e, mais ainda, centros escolhidos por determinados indivíduos para proclamar ideias contrárias à defesa do nosso Ultramar e à disciplina e coesão das Forças Armadas. (...).  Tão nefasta é esta acção que ainda há alguns meses desertaram para a Suécia seis tenentes milicianos, antigos alunos de Engenharia da Academia Militar, que nos termos da legislação até há pouco vigente, tiveram de frequentar os três últimos anos numa escola de engenharia civil de Lisboa e que neste estabelecimento receberam a inspiração suficiente para trair a Pátria (...)”.

   Esta alusão aos seis desertores, permite-nos agora abordar um outro sector, o do Exército.
   O Ministro da Defesa referia-se aos Tenentes Milicianos Fernando Mariano Cardeira, Artur Santana Maria Rita, José António  Marta e Silva, Constantino Azenha Lucas, Fernando Pais Mendes e António Baltazar Carmo e Silva, que foram acolhidos na Suécia e que declararam numa entrevista à B.B.C.: “Não estamos de acordo com a guerra colonial (...). Apoiamos sinceramente os homens que, de armas na mão, lutam contra o exército português em África”.
   O acontecimento retumbante desta deserção em grupo é apenas o símbolo, pois o movimento de deserção do exército português constitui uma verdadeira hemorragia silenciosa, que tende a crescer e a alastrar.
   É impossível precisar números, mas contam-se certamente por muitos milhares os portugueses que abandonaram as fileiras e se refugiaram no estrangeiro. Ainda poucos dias antes do citado discurso do Ministro da Defesa, a imprensa internacional noticiava a fuga de mais três tenentes (Albino Costa, Vítor Bray e Vítor Pires) para a Bélgica, onde denunciaram as cumplicidades de Portugal com a África do Sul na luta contra os africanos e o apoio militar da NATO à guerra colonial  (“Le Monde” 25-12-70).
   No jornal “Luso-Canadiano” de 22-9-69 pode ler-se a transcrição de uma entrevista concedida à Rádio “Voz da Liberdade” pelo desertor português Américo Neves de Sousa:  “Em Nampula todos falavam de Mueda. De lá chegavam, todos os dias, soldados feridos, gravemente estropiados, numerosos mortos. Soou a minha vez no dia 12 de Maio, de conhecer Mueda.  Guerra, não sabia contra quem... falava-se da Tanzânia, os oficiais diziam que era contra a Rússia...  Alguns dias decorridos, encontrei um soldado com as mãos todas sujas de sangue. Perguntei-lhe de onde vinha e ele tinha atacado uma aldeola e tinham morto toda a população, velhos, mulheres e crianças. A repugnância dominou-me, não podia suportar aquela ideia. Desertei quando me convenci de que a guerra era desumana e de que não temos o direito de lutar um povo que só quer a sua liberdade”.

   Se acrescentar-mos a esses desertores toda aquela multidão de jovens portugueses que emigram antes de fazer o serviço militar (muitos deles exactamente para fugir à guerra), poderemos fazer uma ideia das proporções que atingiu a recusa à política colonial por parte da juventude. Não é por acaso que tão grande número de portugueses que emigram têm entre 15 e 20 anos. E não faltam testemunhos de emigrantes a confirmar que a objecção de consciência está na origem de muitas fugas à tropa:  “Como viver na prespectiva de deixar a pele em  África, “defendendo a civilização cristã e ocidental”, vendo ao mesmo tempo essa civilização simbolizada e concretizada em roças, concessões mineiras, monopólios de plantações e populações analfabetas quase a cem por cento ?” (escreve um deles residente em França).
  
Em "Cadernos Coloniais" - 1971


                              

20 outubro 2010

Universitários em Tribunal Plenário - 1972

INFORMAÇÂO DO CHEFE DE BRIGADA DA DGS, António Capela

"Como resultado das diligências a que se vem procedendo, referentes aos presente autos que são arguidos António Jorge Pais Ribeiro da Cunha, Luís Eduardo Abreu Lima Ramos, Maria Fernanda º Magalhães Mateus, Jorge Freitas Seabra, Luís  Carlos Januário dos Santos, Joaquim Francisco da Mota Barbosa, e José Durte da Silva Vaz Teixeira, todos estudantes universitário, relativamente aos cinco primeiros cumpre-me informar a V. Exª o seguinte:

   O - António Cunha, aluno do 2º ano da Faculdade de --- de Coimbra – foi detido em 11 de Fevereiro do corrente ano, por esta Direcção-Geral, quando pelas 12 horas da referida data, junto da estátua de D. Dinis, nas imediações da Universidade de Coimbra, procedia à distribuição de tarjetas da organização clandestina e subversiva que a si própria se intitula “movimento democrático estudantil”, também designada pelas iniciais “M.D.E.”, documentos em que se dava a conhecer a realização de uma “Reunião de Apoio” a António Neto e a Fernando Sabrosa, a efectuar àquela mesma hora no edifício das Matemáticas da referida Universidade.
   Os citados indivíduos, Garcia Neto e Fernando Sabrosa, tendo sido estudantes daquela Universidade, encontravam-se presos e iam começar a ser julgados naquele dia, com outros, no Tribunal Criminal de Lisboa, que os condenou por actividades contra a segurança do Estado, desenvolvidas a favor da associação ilícita e terrorista denominada “movimento popular de libertação de Angola” mais conhecido pelas iniciais “M.P.L.A”.
   Das tarjetas a cuja distribuição o arguido António Cunha, procedia no momento da captura, foram-lhe apreendidos 70 exemplares. No momento da detenção tinha também na sua posse 3 exemplares de um panfleto copiografado intitulado “A destruição sistemática dos seres humanos”, editado pelo citado “movimento democrático estudantil”, e outras publicações que, embora provenientes dos meios estudantis, contêm fraseologia subversiva, propaganda que igualmente lhe foi apreendida.
   Em 2-2-1971, participou numa reunião clandestina que naquela data se efectuou na república dos “PIM-PIM-NELAS”, em Coimbra, promovida pelo chamado “movimento da juventude democrática”, ou simplesmente “juventude democrática”, e preparatória da realizada em 11 do mesmo mês no edifício das Matemáticas da Universidade da referida cidade.
          (...)
   Efectivamente, na referida reunião de 2 de Fevereiro findo, foi decidido fazer-se a do dia 11 do mesmo mês – data do inicio do julgamento dos citados Garcia Neto e Fernando Sabrosa - ,combinando-se no entanto uma outra para o dia 9 antecedente, a fim de assentar em definitivo na realização daquela que se anunciou através da tarjeta que o arguido distribuía quando foi detido.
   Embora a reunião em que participou no dia 2 de Fevereiro referido, tivesse decorrido (...) António Cunha, imediatamente concluiu que a reunião comunicada nestas era a mesma de que se falara naquela, em que estivera presente, e ofereceu-se para as destribuir a uma rapariga estudante, não identificada nos autos, de quem as recebeu, pois concordava inteiramente com os propósitos enunciados em tal documento e, naturalmente, com o “movimento democrático estudantil”.
   Dos seus certificados de registo criminal e policial, juntos a fls. 100 e 101 dos autos, nada consta.

   O - Luís Ramos, aluno do 3º ano de --- na Universidade de Coimbra – foi detido em 12 de Fevereiro último, na referida cidade de Coimbra, pela Delegação local desta Direcção-Geral, por exercer actividades contra a segurança do Estado.
   É membro da lista substituta da Direcção Geral da Associação Académica de Coimbra.
   Numa busca efectuada na sua residência, foi encontrada e apreendida documentação vária, contendo matéria subversiva.
   UM bloco de folhas de recibo da Associação Académica de Coimbra, com anotações diversas no verso dos impressos destinados aos recibos e o símbolo do comunismo – FOICE e MARTELO – desenhado a vermelho numa das respectivas folhas;
   UM panfleto intitulado “À JUVENTUDE” datado de 28 de Março de 1970 e emanado dos “movimentos de juventude democrática”;
   UM cartaz do mesmo “movimento de juventude” começado por “DIA MUNDIAL DA JUVENTUDE...”;
   UMA brochura com o título “ANGOLA E O COLONIALISMO”;
   UM documento copiografado injurioso para esta Direcção-Geral e com afirmações falsas relativamente à situação dos indivíduos detidos ou condenados por actividades contra a segurança do Estado, encimado pelos dizeres manuscritos: “ABAIXO-ASSINADO PARA A LIBERTAÇÃO DOS PRESOS POLITICOS”  e acompanhado de uma folha azul de 35 linhas, que contém os referidos dizeres e uma assinatura do citado arguido;
   TRÊS exemplares do já citado documento intitulado “A DESTRUIÇÃO SISTEMÁTICA DOS SERES HUMANOS”, editado pelo denominado “movimento democrático estudantil”;
   UM panfleto constituído por duas folhas dactilografadas começado por “Esquerda Democrática Estudantil – BALANÇO DAS ELEIÇÕES E PERPESCTIVAS DE LUTA”;
   VINTE E QUATRO exemplares de uma estampa com os dizeres: “17 de Abril – UNIVERSIDADE LIVRE”;
   UM desenho acompanhado dos dizeres: BAIXA DA BANHEIRA – BARREIRO – VILA FRANCA – PORTUGAL EM LUTA – 1º Maio 1970”.
   Este arguido, em 11 de Fevereiro último participou na reunião (...)  e alguns dias antes, numa outra preparativa (..) onde usou da palavra.
Na referida em primeiro lugar, foi constituída uma comissão formada por todos os elementos presentes, cerca de uma centena, e por conseguinte também por ele, Luís Ramos, destinada a apoiar Garcia e o Sabrosa, atrás referidos.
   Dos seus certificados de registo criminal e policial, juntos a fls. 102 e 103 dos autos, nada consta.

   O - Maria Mateus, aluna do 2º ano de (...) na Faculdade de Letras de Coimbra – foi detida pela Policia de Segurança Pública naquela cidade, em 5 de Março próximo passado, quando discretamente procedia à distribuição, na via pública, de panfletos por estudantes, tendo no momento da detenção atirado com alguns desses panfletos ao ar e demonstrado desdém e desprezo pelo guarda captor, ao qual procurou esquivar-se.
   Além de tais panfletos, convocatórios de uma assembleia magna de estudantes, para discutir, entre outros assuntos, medidas a tomar referentes à “libertação dos colegas presos”, era ainda portadora de outros documentos subversivos, entre os quais, cartazes e figuras humanas com braços e punhos no ar e os dizeres: “FACE À REPRESSÃO: UNIDADE – COIMBRA 1971”, trazendo dentro de uma pasta de mão.
   Efectuada uma busca na sua residência, ali foi encontrada e apreendida considerável quantidade de documentação subversiva, alguma da qual constituída por propaganda da organização terrorista “PAIGC”, sendo de salientar ainda da mesma: diversos cartazes, um dos quais representando LENINE, uma fotografia de “CHE” GUEVARA e um outro documento com a cara do chefe terrorista AMILCAR CABRAL, documentação esta que tinha afixada nas paredes do seu quarto; folhas de papel de vinte e cinco linhas, encimadas pelo título “FUNDOS PARA OS PRESOS POLITICOS”, duas das quais com algumas assinaturas e importâncias à frente das mesmas mencionadas; e uma fotografia contendo um chimpanzé com óculos e frases, documento que é uma ofensa à honra e consideração devidas a Sua Excelência o Chefe de Estado, e que também tinha a decorar o seu quarto, como ela própria afirmou.
     Esta arguida, no primeiro auto que lhe foi levantado recusou-se a responder às perguntas que lhe foram feitas. Em outros autos já assim não procedeu, mas confrssou apenas:
   - Que procedeu à destribuição de CINQUENTA exemplares da tarjeta editada pelo "movimento democrático estudantil", convocatória da reunião de apoio aos GARCIA NETO e FERNANDO SABROSA, antes referidos, efectuada em 11 Fevereiro transacto, no edificio das Matemáticas da Universidade de Coimbra:
   - Que partecipou na referida reunião de apoio;
   - Que foi de sua iniciativa a feitura da zincogravura que lhe foi apreendida, pela qual pagou CINQUENTA E TAL ESCUDOS, destinando-se à obtenção de cupões para com eles angariar fundos destinados à compra de papel para comunicados;
   - Que são da sua autoria e iniciativa os documentos manuscritos que lhe foram apreendidos encimados pelo título "FUNDOS PARA OS PRESOS POLITICOS",
   (...)
   Pelos factos referidos, parece poder afirmar-se que acitada arguida, MARIA FERNANDA MATEUS, é elemento activo da organização clandestina que se denominou "movimento de juventude democrática" e agora se intitula "movimento democrático estudantil", ou "M.D.E.", negando-se ela, no entanto, pertencer a qualquer organização ilícita, secreta e subversiva ou terrorista.
   Dos seus certificados de registo criminal e policial, juntos a Fls. 372 e 373, nada consta.
  

  O - Jorge Seabra, aluno 5º ano da Faculdade de Medicina – foi detido em 5 de Março findo, na cidade onde estuda, por esta Direcção-Geral, sob a acusação de desenvolver actividades contra a segurança do Estado.
   O local preciso da detenção deste arguido foi o quarto domiciliário da também arguida (...), onde foi encontrado quando funcionários desta Direcção-Geral, acompanhados por ela, ali se deslocaram para efectuarem a busca que lá se passou.
   Na busca efectuada na residência de Jorge Seabra, que é na república “KIMBO DOS SOBAS”, em Coimbra, foi encontrada e apreendida diversa documentação contendo matéria subversiva, recusando-se ele a assinar o respectivo auto, embora tivesse estado presente àquele acto.
   Entre a referida documentação apreendida, encontram-se dois abaixo-assinados, um com 95 assinaturas, sendo a primeira a do próprio arguido Jorge Seabra, e outro com 97, destinados a serem enviados a Sua Excelência o Senhor Presidente do Conselho, onde se exprime o desejo de uma “completa amnistia para a libertação de todos os presos politicos”.
   Este arguido, quando foi levantado o seu primeiro auto de perguntas, recusou-se a assiná-lo, bem como a prestar declarações.
   O arguido Jorge Seabra, que é um dos elementos da organização ilícita e subversiva denominada “ movimento democrático estudantil, participou na reunião (...), no 11 de Fevereiro findo, usando ali da palavra e sendo eleito membro do executivo da “comissão de socorro aos presos políticos”, que ficara constituída por todos os presentes na mesma reunião.
   Tomou também parte numa das reuniões efectuadas antes daquela na república dos “PIM-PIM-NELAS”, onde já se falou no “auxilio aos presos politicos” e se projectou a realização da levada a efeito no dia 11, atrás referida.
   Leu os panfletos do “movimento democrático estudantil, concordando com os textos respectivos, que não considerava de apoio ao terrorismo, embora soubesse que o Neto e Sabrosa em tais documentos citados iam ser julgados sob a acusação de fazerem parte do chamado “movimento popular de libertação de Angola” vulgarmente designado pelas iniciais “MPLA”.
   Num dos seus autos, não só se considera elemento do “movimento democrático estudantil” como também do “movimento de juventude democrática”, mas não reconhece a ilegalidade destas organizações nem que sejam subsidiárias de outras também ilegais.
   Dos seus certificados de registo criminal e policial, juntos a fls. 374 e 375 dos autos nada consta.


   O - Luis Santos do 3º ano da Faculdade de Medicina de Coimbra – foi detido em 10 de Março findo, na cidade onde estuda, por esta Direcção-Geral,  sob a acusação de exercer actividades contra a segurança do Estado.
   Nas buscas pessoal e domiciliária que lhe foram passadas, encontraram-se e apreenderam-se alguns documentos que contêm matéria subversiva.
   Inicialmente não só negou as actividades delituosas de que vinha acusado, como até mesmo se recusou a assinar o respectivo auto de perguntas.
   Depois num 2º auto que assinou, narrou o seguinte:
   Que participou na reunião que se efectuou em 9 de Fevereiro transacto na república dos “PIM-PIM-NELAS” em Coimbra, promovida pelo chamado “movimento democrático estudantil”, na qual foi aprovado um comunicado acerca do que designou por “problema  da guerra colonial” para sair posteriormente, bem como fazer-se a já citada tarjeta convocatória da realização da reunião que teve lugar no edifício das Matemáticas em 11 do mesmo mês e na qual igualmente tomou parte.
   Que concorda na generalidade, com os pontos apresentados na citada reunião do edifício das Matemáticas e que se sente ligado à sua consecução. Nessa reunião, que, como é sabido, teve o declarado propósito de apoiar os elementos do chamado “movimento popular de libertação de Angola”, vulgarmente designado por “MPLA”, ANTÓNIO MANUEL GARCIA NETO e FERNANDO EMILIO DE CAMPOS SABROSA, já várias vezes citados, foi criada uma “comissão de apoio aos presos políticos”, sendo ainda ali decidido, segundo este arguido, tentar-se formar um “movimento político” dos estudantes que fosse considerado legal pelas autoridades e pudesse discutir os problemas nacionais nas próprias faculdades.
   Dos seus certificados de registo criminal e policial, juntos fls. 376 e 377 dos autos, nada consta.


   Estes factos submeto-os ao elevado critério de V. Exª, para os fins que julgar convenientes.

                Lisboa, 5 de Abril de 1971.


                                 O CHEFE DE BRIGADA,

                                              António Capela "

P.s.  maiusculas e entre aspas, conforme texto.

Santos da Casa

Como o conhecia com vinte anos, um amigo, companheiro, camarada ?
Ou já um militante Professor ou Dr. ?
Personalidade conversiva, voz forte (um pouco arranhada) e firme. Discurso dialecticamente  estruturado e como tal pouco claro ao comum dos mortais.
Mais observador do que cooperante nas (ou das) generalidades.
Humor sarcástico,  sempre fiel às suas convicções, que as suas leituras denunciavam.
Habitualmente com o casaco preto de cabedal, cabelo solto e farto, ar atlético, qual condutor de massas.
Já se passaram 40 anos e não o vi mais em pessoa, a não ser à poucos anos numa sessão de desenhos animados da ‘A R’ na televisão portuguesa.
Desconhecia a sua faceta de escritor (ou ensaísta ) até que me deparei com a sua foto num livro.
Neste caso “ Pessoas, animais e outros que tais ” e intuitivamente, conhecendo remotamente Pedro Baptista (com p), tive curiosidade em saber em que classe me incluía adquirindo o livro para o ler.
Sem denunciar a minha conclusão, não me desiludiu, mas conclui que a metamorforse  é um vírus de livre propagação, sem no entanto deixar de gostar do que li. Foi agradável para o meu cérebro pensante, apesar de não ter nada contra o Free Jazz.
Posteriormente fiz a leitura do “ Sporá ” e... eurecka!.
Um abraço Pedro Baptista.

*    PESSOAS, ANIMAIS E OUTROS QUE TAIS
Editora: Campo das Letras – colecção: Instantes de Leitura
*    SPORÁ
Editora: Edições Afrontamento – colecção: Fixões/41